16.6.07

Fanny och Alexander


Sejamos directos: Fanny och Alexander, de Ingmar Bergman, é um dos filmes mais perfeitos e completos alguma vez feitos. O poder dramático desta obra-prima monumental vem precisamente daí: da quantidade de temas e perspectivas abordados, desde a infância à velhice; do tratamento dado a cada personagem, como se não existissem secundários, mas tivessem todos uma importância fundamental no desenvolvimento narrativo e na construção das outras personagens; da complexidade e do radicalismo das ideias dramáticas e da forma como se relacionam com a imaginação de Alexander, que, caso seja necessário apontar alguma, é de facto a personagem principal do filme. Está tudo na medida certa durante as 5 horas e 12 minutos de duração da versão televisiva: não há um único diálogo de informação inconsequente nem um único ponto narrativo em que algo fique por dizer; todo o filme é, enfim, uma obra de perfeito equilíbrio na forma e no conteúdo.

Na cena inicial, vemos Alexander sozinho numa casa, onde tem uma visão da morte. Durante o desenrolar do primeiro acto, conhecemos a família Ekdahl numa reunião para celebrar o Natal. São-nos apresentados os dramas individuais de cada personagem, mas sobretudo a força da união que existe na família e a felicidade em que vivem as crianças. Porém, a presença da morte, que surgira a Alexander na cena inicial, acaba por se relevar no segundo acto com o falecimento de Oscar, o pai de Fanny e de Alexander. E é assim que, de uma forma geral, a morte vai dando lugar à vida existente durante o primeiro acto, prosseguindo com o casamento de Emilie (viuva de Oscar) com o autoritário bispo Edvard Vergerus e o abandono por parte de Emilie e das crianças da casa colorida em que habitavam para a frieza da habitação do bispo.

E o filme poderia, com alguns ajustes, acabar aí, no final do quarto acto, já explorada a relação do bispo com Emilie e com as crianças. Se terminasse, seria na mesma, diga-se, um poderosíssimo drama humano. Mas ainda nos espera o quinto e último acto do filme, com duração de quase hora e meia. E nada nos pode fazer esperar o que aí vem: é aí que o ciclo se completa e que o desenvolvimento de personagens que tinha acontecido durante o primeiro acto adquire toda a importância dramática; e é aí que as cenas da imaginação de Alexander atingem o ponto máximo de transcendência na relação com a realidade, naquela história de peregrinação que lhe é contada para adormecer, mas que o deixa mais desperto que nunca (uma das mais belas cenas de cinema de que há memória?).

Não vi a versão de cinema, com pouco mais de três horas, mas, segundo o que li, as cenas cortadas foram maioritariamente as da imaginação de Alexander, o que é compreensível, dado que são as menos necessárias para que a narrativa faça sentido. Mas, na verdade, é esse lado do filme que faz a diferença, na medida em que o eleva de obra-prima com grande poder dramático a um patamar divino, religioso, transcendente... Uma das maiores obras de arte da História do Cinema, com uma edição em DVD pela Criterion à altura.

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