O Fado do Cansaço
É irónico pensar no desdém com que é encarado o cinema português pelo público em geral, grupo em que me incluí durante largos anos, e depois contrastá-lo com filmes como Amália, de Carlos Coelho da Silva, também responsável pela última encarnação nas salas d’O Crime do Padre Amaro. O intuito seria capturar na tela um pouco da alma do povo português na sua embaixatriz mais ilustre e celebrada, contando a sua história desde a infância até dez anos antes da sua morte. Coelho da Silva pretende logo impressionar com falsas demonstrações de domínio de câmara, que se vêm revelar inconsequentes e, pior que tudo, académicos, deixando o filme cair na fórmula já muito esbatida do biopic norte-americano. E se este modelo caduco pode já ter sido proveitoso, é totalmente desadequado para Amália Rodrigues, ao ponto de poder ser considerada heresia a desfiguração da pessoa em prol de uma acessibilidade mais banalizante telenovelesca.
Sandra Barata Belo é a única que consegue escapar com uma nesga de redenção, ainda que secundada por um dos piores e mais execráveis elencos dos últimos tempos. Entre os seus trunfos encontram-se diálogos glaciais e debitados à ameaça de bala, gags involuntários e sotaques forçados e ultrajantes, no qual se destaca o inenarrável “dialecto” brasileiro conjurado por Ricardo Carriço para César. A realização não consegue nunca ultrapassar a sua inapta condição atabalhoada e nem mesmo com um “modesto” orçamento de três milhões de euros foi capaz de se elevar para além do programático e do expectável. No entanto, existem certos momentos ou planos de câmara onde se sente o contentamento do maestro em incendiar vastas porções do orçamento. O remate final, já com o ecrã em negro, é “Dizem que morreu em 1999... enganam-se!”.
Numa nota mais pessoal e voyeurista, no final do visionamento, assisti a uma conversa entre uma turista francesa e a amiga portuguesa, que provavelmente a tinha levado a ver o filme para conhecer um pouco melhor a maior figura do mundo artístico português. A primeira estava desiludida, apontando ao filme muitas das suas falhas evidentes, ao que a segunda se desculpou dizendo “para português não está mau”. É este espírito de conformismo debilitante que tem de ser rapidamente combatido. Mas quando a filmes como Amália são financiados e publicitados tão colossalmente e objectos de verdadeiro fulgor artístico como Entre os Dedos são totalmente descartados e deixados ao abandono, é de concluir que não é de todo algo que seja culpa dos que visitam as salas de cinema em busca de alguma empatia. Se haviam esperanças que, tendo em conta a grandiloquência e imortalidade de Amália, pudesse surgir algo do qual se pudessem orgulhar, viram todas essas expectativas dissiparem-se velozmente. Amália merecia melhor. E o público também.
Sandra Barata Belo é a única que consegue escapar com uma nesga de redenção, ainda que secundada por um dos piores e mais execráveis elencos dos últimos tempos. Entre os seus trunfos encontram-se diálogos glaciais e debitados à ameaça de bala, gags involuntários e sotaques forçados e ultrajantes, no qual se destaca o inenarrável “dialecto” brasileiro conjurado por Ricardo Carriço para César. A realização não consegue nunca ultrapassar a sua inapta condição atabalhoada e nem mesmo com um “modesto” orçamento de três milhões de euros foi capaz de se elevar para além do programático e do expectável. No entanto, existem certos momentos ou planos de câmara onde se sente o contentamento do maestro em incendiar vastas porções do orçamento. O remate final, já com o ecrã em negro, é “Dizem que morreu em 1999... enganam-se!”.
Numa nota mais pessoal e voyeurista, no final do visionamento, assisti a uma conversa entre uma turista francesa e a amiga portuguesa, que provavelmente a tinha levado a ver o filme para conhecer um pouco melhor a maior figura do mundo artístico português. A primeira estava desiludida, apontando ao filme muitas das suas falhas evidentes, ao que a segunda se desculpou dizendo “para português não está mau”. É este espírito de conformismo debilitante que tem de ser rapidamente combatido. Mas quando a filmes como Amália são financiados e publicitados tão colossalmente e objectos de verdadeiro fulgor artístico como Entre os Dedos são totalmente descartados e deixados ao abandono, é de concluir que não é de todo algo que seja culpa dos que visitam as salas de cinema em busca de alguma empatia. Se haviam esperanças que, tendo em conta a grandiloquência e imortalidade de Amália, pudesse surgir algo do qual se pudessem orgulhar, viram todas essas expectativas dissiparem-se velozmente. Amália merecia melhor. E o público também.
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