8.11.06

Dentro do cinema

Será possível recuperar a ligeireza trágica que as imagens da Nouvelle Vague pareciam sussurrar como se os pequenos detalhes afectivos do mundo e dos seus actores pudessem encerrar em si a imprevisibilidade irreversível da verdade? Como se a sequência dos detalhes mais efémeros do mundo pudessem compor uma história tanto mais complexa quanto revemos nela os espaços soltos e aparentemente irrelevantes que preenchem o nosso Ser. Muitos poderão pensar que falta a densidade que uma construção mais clássica poderia convocar, mas, em boa verdade, não há nada mais sério nem trágico do que a incerteza daquilo que estamos a construir. E «Dans Paris» herda de digníssimos nomes (Godard, Truffaut, Rivette, ...) a fragilidade sempre presente das suas narrativas, como se a complexidade do mundo dependesse, sobretudo, da disponibilidade de o olharmos.

«Dans Paris» é uma das experiências mais comoventes deste ano e, sem hesitações, um dos filmes mais urgentes de se descobrir. Por razões cinematográficas, afectivas, humanas, mas, sobretudo, por nos relembrar que ser espectador não é tanto uma opção, mas um compromisso que assumimos com a nossa intimidade, com a intimidade que está do outro lado da tela e com todos os novos espaços que se desconstroem à nossa volta. «Dans Paris» conta a história de dois irmãos reunidos pela tragédia pessoal do mais velho que chora de forma quase autodestrutiva o amor que perdeu. O seu irmão mais novo, Jonathan, assume a sua ligeireza amorosa com despreocupação, percorrendo Paris como se fosse um mapa de aventuras amorosas que vai correndo como alguém que desistiu de viver muito antes do seu irmão mais velho. Ambas as tragédias destes dois irmãos se cruzariam de forma diferente e, como sempre, a presença/ausência da figura feminina decide todos os dilemas dramáticos. Um filme tão urgente quanto o amor!

2 comments:

C. said...

Só ouço/leio elogios a este filme! Tenho mesmo de o ir ver...

João Ricardo Branco said...

É um bom filme! Mas não tão bom como o têm pintado. Noto por aí alguma sobrevalorização...

Mas, Wasted Blues, merece sem dúvida um visionamento!