Balanço de 2008 (João Ricardo Branco)
1. Ne Touchez pas la Hache (Jacques Rivette)
2. The Happening (M. Night Shyamalan)
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3. Before the Devil Knows You're Dead (Sidney Lumet)
4. La Frontière de L'aube (Philippe Garrel)
5. There Will Be Blood (P.T. Anderson)
6. Aquele Querido Mês de Agosto (Miguel Gomes)
7. We Own the Night (James Gray)
8. Tropa de Elite (José Padilha)
9. Cassandra’s Dream (Woody Allen)
10. Coeurs (Alain Resnais)
E eis que ao cair do pano chega o filme do ano! Na verdade, «Ne Touchez pas la Hache» não é de 2008 (o seu ano de produção é 2007) nem sequer estreou nas salas de cinema portuguesas: foi lançado directamente nas prateleiras do mercado de DVD nestas últimas semanas do ano. E se isto, só por si, diz muito (e mal) sobre o estado da distribuição de filmes no nosso país, nada diz, no entanto, sobre o maravilhoso filme de Rivette.
«Ne Touchez pas la Hache» é um filme que nos atinge como um raio na mesma medida em que as palavras de Antoinette atingem o general Montriveau no início da narrativa quando esta — agora uma freira enclausurada — lhe suplica humildemente que não a trate por Antoinette porque as lembranças do passado são dolorosas… O diálogo prossegue depois mais uns momentos até que as cortinas que separam a freira e o visitante se fecham abruptamente e o filme suspende em absoluto a acção presente e viaja, num enorme flashback, até 5 anos antes, altura em que os dois se conhecem e, contra a sociedade parisiense de início de século XIX, se apaixonam.
É nesse imenso e doloroso passado que Rivette se instala para, com precisão de relojoeiro e sensibilidade de poeta, contar mais uma história de amor louco. O realizador adapta aqui muito fielmente o belíssimo «La Duchesse de Langeais» de Balzac, preservando inclusivamente a riqueza da escrita do novelista francês, ao mesmo tempo que, do ponto de vista cinematográfico, vinca fortemente as suas marcas de realizador, sobretudo no que respeita ao tratamento do tempo e da mise-en-scène. A dupla de actores Guillaume Depardieu e Jeanne Balibar faz o resto, num insuperável trabalho de representação: a tristeza lancinante empregue por Depardieu e o abismo interior criado por Balibar são quase milagrosos e esmagam-nos por completo. Tudo o que é preciso saber sobre o amor está neste filme.
Destacado de tudo o resto surge também «The Happening», a extraordinária obra que Shyamalan nos entregou em meados do ano. A personagem central do filme chama-se Alma — como em «Persona» de Bergman — e é com ela que o filme ultrapassa as suas próprias circunstâncias e assume, com a máxima simplicidade, aquilo que verdadeiramente lhe dá vida: a descoberta do sentido maternal. É claro que «The Happening» é também um filme muito inteligente sobre ecologia, política e família. Mas o grande arco narrativo do filme, o seu caminho dramático e emocional, é percorrido por Alma na progressiva descoberta das suas próprias emoções. De resto, nos muito económicos, directos, empolgantes e tensos 90 minutos de película, Shyamalan constrói um notável sentido de urgência, continuando a acreditar, como sempre, no poder transformador do Cinema e na verdade dos seus temas de eleição.
Quanto ao mais, considero que 2008 foi, em termos de estreias nas salas portuguesas, um dos piores anos cinematográficos desde 1930 (para nos ficarmos apenas pela era sonora), porventura mesmo o pior. Tirando os dois filmes acima referidos — e apesar da qualidade dos outros filmes que compõem o TOP10 — pouco mais há que ameace ultrapassar, de forma significativa, as fronteiras do tempo e da memória.
Fora da 7.ª Arte. No Teatro nada me arrebatou tanto como a peça «Rock ‘n’ Roll», que passou pelo Teatro Aberto no primeiro semestre do ano e que fui ver 4 vezes. Impressionaram-me igualmente os monólogos de Beatriz Batarda (a melhor actriz portuguesa) em «De Homem para Homem» (Teatro da Cornucópia/Bairro Alto) e de João Lagarto em «Começar a Acabar» (Teatro Nacional D. Maria II). E em termos de concertos, guardo sobretudo na memória as actuações dos The National (Aula Magna, 11 de Maio), de Róisín Murphy (Optimus Alive, 12 de Julho), de Leonard Cohen (Passeio Marítimo de Algés, 19 de Julho) e de Ornette Coleman (Aula Magna, 5 de Novembro).
E quanto à minha vida em 2008… bom, isso não é para ser revelado neste blogue! Feliz 2009!
2. The Happening (M. Night Shyamalan)
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3. Before the Devil Knows You're Dead (Sidney Lumet)
4. La Frontière de L'aube (Philippe Garrel)
5. There Will Be Blood (P.T. Anderson)
6. Aquele Querido Mês de Agosto (Miguel Gomes)
7. We Own the Night (James Gray)
8. Tropa de Elite (José Padilha)
9. Cassandra’s Dream (Woody Allen)
10. Coeurs (Alain Resnais)
E eis que ao cair do pano chega o filme do ano! Na verdade, «Ne Touchez pas la Hache» não é de 2008 (o seu ano de produção é 2007) nem sequer estreou nas salas de cinema portuguesas: foi lançado directamente nas prateleiras do mercado de DVD nestas últimas semanas do ano. E se isto, só por si, diz muito (e mal) sobre o estado da distribuição de filmes no nosso país, nada diz, no entanto, sobre o maravilhoso filme de Rivette.
«Ne Touchez pas la Hache» é um filme que nos atinge como um raio na mesma medida em que as palavras de Antoinette atingem o general Montriveau no início da narrativa quando esta — agora uma freira enclausurada — lhe suplica humildemente que não a trate por Antoinette porque as lembranças do passado são dolorosas… O diálogo prossegue depois mais uns momentos até que as cortinas que separam a freira e o visitante se fecham abruptamente e o filme suspende em absoluto a acção presente e viaja, num enorme flashback, até 5 anos antes, altura em que os dois se conhecem e, contra a sociedade parisiense de início de século XIX, se apaixonam.
É nesse imenso e doloroso passado que Rivette se instala para, com precisão de relojoeiro e sensibilidade de poeta, contar mais uma história de amor louco. O realizador adapta aqui muito fielmente o belíssimo «La Duchesse de Langeais» de Balzac, preservando inclusivamente a riqueza da escrita do novelista francês, ao mesmo tempo que, do ponto de vista cinematográfico, vinca fortemente as suas marcas de realizador, sobretudo no que respeita ao tratamento do tempo e da mise-en-scène. A dupla de actores Guillaume Depardieu e Jeanne Balibar faz o resto, num insuperável trabalho de representação: a tristeza lancinante empregue por Depardieu e o abismo interior criado por Balibar são quase milagrosos e esmagam-nos por completo. Tudo o que é preciso saber sobre o amor está neste filme.
Destacado de tudo o resto surge também «The Happening», a extraordinária obra que Shyamalan nos entregou em meados do ano. A personagem central do filme chama-se Alma — como em «Persona» de Bergman — e é com ela que o filme ultrapassa as suas próprias circunstâncias e assume, com a máxima simplicidade, aquilo que verdadeiramente lhe dá vida: a descoberta do sentido maternal. É claro que «The Happening» é também um filme muito inteligente sobre ecologia, política e família. Mas o grande arco narrativo do filme, o seu caminho dramático e emocional, é percorrido por Alma na progressiva descoberta das suas próprias emoções. De resto, nos muito económicos, directos, empolgantes e tensos 90 minutos de película, Shyamalan constrói um notável sentido de urgência, continuando a acreditar, como sempre, no poder transformador do Cinema e na verdade dos seus temas de eleição.
Quanto ao mais, considero que 2008 foi, em termos de estreias nas salas portuguesas, um dos piores anos cinematográficos desde 1930 (para nos ficarmos apenas pela era sonora), porventura mesmo o pior. Tirando os dois filmes acima referidos — e apesar da qualidade dos outros filmes que compõem o TOP10 — pouco mais há que ameace ultrapassar, de forma significativa, as fronteiras do tempo e da memória.
Fora da 7.ª Arte. No Teatro nada me arrebatou tanto como a peça «Rock ‘n’ Roll», que passou pelo Teatro Aberto no primeiro semestre do ano e que fui ver 4 vezes. Impressionaram-me igualmente os monólogos de Beatriz Batarda (a melhor actriz portuguesa) em «De Homem para Homem» (Teatro da Cornucópia/Bairro Alto) e de João Lagarto em «Começar a Acabar» (Teatro Nacional D. Maria II). E em termos de concertos, guardo sobretudo na memória as actuações dos The National (Aula Magna, 11 de Maio), de Róisín Murphy (Optimus Alive, 12 de Julho), de Leonard Cohen (Passeio Marítimo de Algés, 19 de Julho) e de Ornette Coleman (Aula Magna, 5 de Novembro).
E quanto à minha vida em 2008… bom, isso não é para ser revelado neste blogue! Feliz 2009!
1 comment:
O problema dos balanços anuais é ter de jogar com as datas de estreia. Resulta semrpe complicado jogar com filmes que se viu há quase um ano, com filmes vistos a semana passado ou até mesmo, como dizem bem, filmes lançados em dvd...Cometi o pecado capital de não ver o novo do Rivette, mas a verdade é que da escola da NV, apesar de ser o mais prolifero, creio que o mais coerente face à sua cinematografia base continua a ser Chabrol.
Cumprimentos
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