Showing posts with label Darren Aronofsky. Show all posts
Showing posts with label Darren Aronofsky. Show all posts

9.2.09

The Wrestler


À semelhança do trabalho magnífico de Bruce Springsteen, também «The Wrestler» se constrói como uma canção que faz o seu herói caminhar à deriva, procurando um refrão que justifique a sua existência e o integre numa dignidade que julgava irreversivelmente perdida. «The Wrestler» é a história de um lutador de wrestling em fim de carreira (alguns diriam, para lá do fim) chamado Randy "The Ram" Robinson a tentar permanecer relevante e a fazer o que mais gosta... até ao momento em que um problema de saúde o leva a repensar o seu modo de vida.


«The Wrestler» é um tour de force, uma história sobre redescobrir quem somos e o lugar que ainda podemos ocupar no mundo, mesmo que o mundo não nos queira nele. Há um realismo inegavelmente comovente na realização de Aronofsky, um compromisso que o cineasta coloca na câmara desde o início, sem receio de procurar a glória e a dignidade em qualquer espaço da vida de Randy, fosse no ringue a conquistar vitórias em lutas previamente encenadas, ou no supermercado a vender carne, seguindo-o e acreditando sempre que a sua história merece ser contada.


É impossível falar de «The Wrestler» sem falar em Mickey Rourke, o actor que Aronofsky queria, desde o início, para o papel e que, inicialmente, por questões comerciais, foi entregue a Nicholas Cage. Mas raras vezes uma personagem encaixou tão bem no actor que a interpretou, de uma forma completamente autobiográfica e com ressonâncias melodramáticas absolutamente devastadoras. Reconhecem-se em Randy, traços das mágoas que Rourke chora do seu passado, da carreira que lhe passou ao lado e que tenta, agora, recuperar.

Os dois redescobrem-se na glória que perseguem e no passado que tentam reviver, num mundo onde procuram o espaço que ainda lhes resta. É essa a comoção de que se falava. A verdade que reaparece por força do ocasional, uma história que merece ser contada ou percebermos que não somos imortais. E, acima de tudo, procurarmos o nosso lugar no mundo e sabermos que, por circunstâncias da vida, ele nunca é o mesmo ao longo do tempo.

10.1.09

Solidão



25.3.07

Morte para lá da vida



Um filme tão luminescente como a própria vida. Nas lágrimas de Hugh Jackman reencontro o meu próprio desespero da morte. Não a minha, mas a do meu próximo; alguém que, por egoísmo meu, tento manter presa a mim mesmo, ainda que ela própria já não o deseje. No olhar dela (rainha ou escritora, confesso que ainda não me decidi) sente-se a consciência da morte e uma serenidade que delicadamente a contradiz e a transforma numa espécie de anacronismo afectivo (perdida algures nas suas duas personagens divididas pelo tempo e reunidas numa mesma tragédia). Nela misturam-se diferentes olhares: a tristeza do real, a possibilidade de fantástico, o misticismo de diferentes transcendências, mas, antes do mais, sente-se nela o olhar de uma criança que redescobriu que, afinal de contas, a morte não é o fim. Não por (como uma criança) não saber que existe morte, mas por reaprender a viver com ela.

«The Fountain», de Darren Aronofsky encerra a primeira trilogia de filmes do cineasta e, apesar de tematicamente distantes, há sempre uma iminência carnal que partilham: o braço roxo e apodrecido de Jared Leto em «Requiem for a Dream», por exemplo, pode ser reencontrado no dedo anelar de Hugh Jackman que ele próprio, obsessivamente, feriu para marcar no corpo uma memória que quer manter sempre consigo, até ao fim dos tempos. A câmara de Aronofsky mantém-se atenta à rotina das coreografias banais do corpo humano, deliciada pela possibilidade de as filmar como se nada mais no mundo existisse além da mímica do nosso próprio corpo. E, curiosamente, para um cineasta tão obcecado por pequenas referências visuais, «The Fountain» é um filme que, à falta de melhor palavra, é incrivelmente espiritual. Não só por convocar essa temática, mas também por filmar os seus actores com uma proximidade que coloca em causa a sua própria intimidade, as suas próprias ideias e crenças.

Nunca será demais relembrar a qualidade da prestação dos actores, sobretudo de Hugh Jackman cuja entrega mental e afectiva comove para lá dos dilemas da própria personagem. «The Fountain» é um acontecimento nuclear da segunda metade desta década e absolutamente obrigatório.

15.3.07

A Fonte Pariu um Rato


Depois de seis anos de ausência, o prodígio Aronofsky está de volta. Deixando para trás a originalidade demencial de Pi (1998) e a viagem aos infernos de Requiem for a Dream (2000), o realizador não fez a coisa por menos e decidiu tratar o tema da vida eterna. Após atribuladas discussões, badaladas notícias, reduções de orçamento, trocas de actor principal e anúncios de abandono, o filme aí está, protagonizado pela companheira do realizador Rachel Weisz e pelo australiano Hugh Jackman.

O fio narrativo condutor não podia ser mais simples - Tom Creo (Hugh Jackman) procura desesperadamente encontrar uma cura para o cancro, travando assim a eminente morte da sua mulher Izzi (Rachel Weisz). Paralelamente existem outras duas linhas, uma no tempo da Espanha dos Conquistadores e outra num futuro indefinido, que servem como extensões figurativas da busca de Tom, procurando atingir uma ideia - nunca conseguida aliás - de adimensionalidade temporal e espacial da busca.

Aronofsky centra toda a dinâmica de emoções do filme na relação de Jackman com a mulher e, em particular, no aceitar da morte desta. Talvez o único sucesso do filme seja mesmo a forma como é conseguida em poucas imagens, com alguma subtileza (que falta ao resto do filme) e adoptando uma estética de close-ups, consubstanciar o laço transcendente que une os dois seres e a tragédia íntima que os ameaça.

Partindo daqui eram quase infinitos os caminhos que Aronofsky poderia trilhar, tantos quantas as possibilidades filosóficas, ontológicas, éticas e humanas este tema poderia abarcar. Infelizmente, o escolhido foi a auto-estrada da facilidade.

Respondendo ao que não deveria responder, mostrando aquilo que deveria ser o insondável, o filme embarca numa viagem que converge progressivamente para uma validação de um misticismo new-age, vindo desembocar num simplismo que não pode deixar de ser sancionado. Esteticamente, as imagens apresentadas no sentido da artificialidade, tomando o kitsch o lugar do clímax emocional. A hipnotizante música de Clint Mansell bem tenta resgatar as imagens do espartilho de realismo alucinado, mas não pode dar aquilo que não está lá, conduzindo à esquizofrenia sensorial inevitável - por mais que queiramos aquilo que vemos não é aquilo que estamos a ouvir.

The Fountain é como aqueles detergentes que tem a embalagem mais bonita e a melhor campanha de publicidade, mas que no fim da lavagem deixam as nódoas mais difíceis todas na roupa.

13.3.07

Imortalidade em/do Cinema

The Fountain é um filme que nos fala, a partir de uma história de amor, da busca da imortalidade. E é, também, um filme diferente de qualquer coisa que alguma vez tenha sido feita, na forma como a viagem de Tom (Hugh Jackman) é desenvolvida, para descobrir como ultrapassar a morte. Aronofsky arriscou, e entregou-se, assim como os actores, de forma total ao filme, o que se nota acima de tudo na forma como os actores são filmados, em especial Jackman, que tem uma interpretação magnífica.

Acreditem quando vos digo que adoraria estar aqui a dizer que The Fountain é uma das histórias de amor mais transcendentes alguma vez filmadas. Mas a verdade é que senti sempre um grande distanciamento face às personagens no presente, e consequentemente à busca de Hugh Jackman que se desenvolve nas três linhas narrativas. Poderia entrar na onda de críticas (que não são poucas) que arrasam por completo o lado místico e simbólico do filme, mas não o farei, não porque considere essa vertente do filme magnífica, mas porque penso que não é aí que reside o problema.

Para mim, tudo parte da ligação emocional que se sente inicialmente com as personagens. Aqueles já muito criticados planos grandiosos de Hugh Jackman a flutuar no espaço dentro de uma bolha, entre outros, nada têm de oco ou de espalhafato visual. São completamente serviçais à narrativa e às personagens, e portanto é natural que, para nos identificarmos com eles, nos tenhamos também que, antes disso, identificar com a história que está a ser contada. Aliás, não se trata de uma mera identificação: o que os admiradores do filme descrevem é uma absoluta envolvência emocional, que realmente não senti.

Porque não? É, obviamente, a mais difícil das questões, em especial num filme com aspectos tão fascinantes. Com um só visionamento (e que não foi o melhor dos visionamentos, devido a fraca qualidade sonora e de projecção), posso dizer que umas das razões para esse distanciamento talvez tenha sido o facto de Darren Aronofsky nos colocar de imediato no meio da narrativa. Não temos qualquer informação (e muito menos desenvolvimento, claro) sobre o passado de Tom e Izzi (magnífica Rachel Weisz, também), mas somos de imediato inseridos na busca de Tom. Aronofsky aposta tudo na entrega dos actores (que é de facto, de louvar), mas comigo não foi suficiente.

A propósito, ainda esta semana tive a ver esse filme sublime que é o Solaris de Steven Soderbergh. Acho que tenho direito a esta comparação, na medida em que são dois filmes deste novo milénio, de ficção científica, e a lidar com a procura da imortalidade. Porém, ainda que tematicamente próximos (e são também próximos nas reacções drasticamente opostas que geram), são filmes com abordagens muito diferentes. O objectivo de Aronofsky ao contar aquela história é claro, a sua entrega emocional igualmente, a sua grandiosidade visual, idem. O de Soderbergh é muito mais subtil, as emoções e os sentimentos mais escondidos (basta comparar as interpretações de Clooney e Jackman; o primeiro sempre em extrema contenção dramática, o segundo tem várias cenas em que chora compulsivamente), e sim, também é visualmente belo, mas não grandioso.

Não querendo, à partida, criticar qualquer uma das diferentes abordagens, a verdade é que me senti, contrariamente ao que aconteceu em The Fountain, completamente envolvido no filme de Soderbergh, a ponto de o considerar uma das grandes obras desta década. Fascinou-me muito mais a surdez das emoções e dos sentimentos tão bem capturados p
or Soderbergh, tanto nos silêncios como nos diálogos. Senti-me muito mais envolvido na busca de Clooney, mais abstracta e contida, desde aquela espantosa cena em que a temática da imortalidade é definida, quando, em flashback, se encontra com a mulher pela primeira vez, e cita o poema de Dylan Thomas que o acompanhará em todo o filme. And death shall have no dominion. E sim, encontro muito mais desencantamento, muito mais as perturbações da solidão, em cada plano de cada olhar dos actores de Solaris e em cada frase que é dita e em cada uma que fica por dizer.

Mas, voltando ao filme de Aronofsky, é sem dúvida um filme que quero rever um dia. Uma das razões, é a já referida falta de condições em que o visionamento ocorreu. Outra, será procurar de forma mais clara as razões para ter sentido tal distanciamento. Ou quem sabe, para passados uns tempos, já não sentir tal distanciamento. O Cinema (e a arte em geral) também tem essa particularidade, em especial quando se trata de filmes tão radicais e que vêm directamente do fundo do coração de quem os faz, para a alma de cada espectador. E se The Fountain é alguma coisa, é um filme com alma e coração. Assim como outros filmes que estrearam recentemente. Lady in the Water, de M. Night Shyamalan, é um desses filmes. The New World, de Terrence Malick, é um desses filmes. E essa entrega total, será sempre de admirar. Até porque é ela que também garante a imortalidade do Cinema.