4 Notas sobre «Zodiac»
1) David Fincher é, em doses iguais, um realizador sobrevalorizado e um artesão virtuoso. Se é inegável a sua mestria técnica e narrativa, também parece que o seu Cinema raras vezes atinge a profundidade e relevância que poderia alcançar. Em «Se7en», o seu filme mais perfeito e significativo, Fincher atinge um patamar qualitativo que jamais voltou a contemplar; e se em «The Game», notável jogo existencial, o realizador americano volta a desarmar o espectador, em «Fight Club» (de longe o seu pior filme) estatela-se em absoluto numa patetice sem remissão. «Alien 3» e «Panic Room» parecem-me filmes algo irrelevantes na filmografia do realizador.
2) «Zodiac» surge, neste contexto, como um dos melhores e mais interessantes filmes de Fincher. Trata-se, a meu ver, de uma obra de enorme riqueza dramática, que oferece ao espectador personagens consistentes, um conjunto de camadas temáticas bastante pertinentes e um apuro técnico verdadeiramente invejável. Podemos encontrar aqui todo o virtuosismo de Fincher, quer na forma como movimenta a sua câmara, quer nas soluções visuais que encontra para desenvolver a narrativa. Mas a mestria narrativa do realizador americano surge aqui sobretudo no modo como procura manter-se próximo das suas personagens, em detrimento de uma excessiva estilização e retórica visual.
3) As personagens: «Zodiac» é, antes de mais, um filme em que se sentem permanentemente as marcas humanas deixadas pelas personagens que o povoam. Não são, pois, como sucede frequentemente no moribundo modelo do thriller contemporâneo, meros bonecos que se passeiam pela narrativa para fazer avançar a história e para desvendar os mistérios “habilidosamente” fabricados pelo argumentista. As personagens deste filme são meticulosamente construídas e mesmo os elementos mais secundários surgem insuflados de humanidade. Jake Gyllenhaal (o cartoonista), Robert Downey Jr. (o jornalista) e Mark Ruffalo (o polícia) formam um notável vértice humano que espelha todas as fragilidades e dúvidas de uma caminhada por uma verdade.
4) As camadas temáticas: «Zodiac» narra a história, baseada em factos verídicos, da investigação de uma série de homicídios que assolaram a baía de São Francisco nos anos 70 do século passado. À superfície temos, pois, uma narrativa essencialmente policial: perante uma série de homicídios reivindicados por um serial-killer misterioso, desencadeia-se uma investigação em busca do criminoso. Sucede, no entanto, que as circunstâncias que rodearam estes crimes permitem analisar um conjunto de outras questões, que Fincher expõe, com enorme inteligência e subtileza, em toda a sua complexidade. A busca das três personagens principais (e, digamos, do foco da câmara de Fincher) deixa a determinada altura de ser uma busca policial para passar a ser uma busca pessoal, deixa de ser a busca de um assassino para passar a ser a busca de um reequilíbrio interior. Ao atentar sobretudo nas consequências do crime para os investigadores, ao penetrar nas teias obsessivas por eles criadas, «Zodiac» afirma-se como um filme sobre a amarga inquietude da dúvida, sobre o desassossego interior provocado por uma caminhada sem retorno. E se a natureza da verdade, a ambiguidade dos comportamentos e as relações com os media são também temas amplamente analisados, retém-se sobretudo essa perseguição feita pelas personagens centrais. Uma perseguição que é uma espiral onde o espaço perde identidade e o tempo parece entrar em colapso. Só sobra a obsessão.
2) «Zodiac» surge, neste contexto, como um dos melhores e mais interessantes filmes de Fincher. Trata-se, a meu ver, de uma obra de enorme riqueza dramática, que oferece ao espectador personagens consistentes, um conjunto de camadas temáticas bastante pertinentes e um apuro técnico verdadeiramente invejável. Podemos encontrar aqui todo o virtuosismo de Fincher, quer na forma como movimenta a sua câmara, quer nas soluções visuais que encontra para desenvolver a narrativa. Mas a mestria narrativa do realizador americano surge aqui sobretudo no modo como procura manter-se próximo das suas personagens, em detrimento de uma excessiva estilização e retórica visual.
3) As personagens: «Zodiac» é, antes de mais, um filme em que se sentem permanentemente as marcas humanas deixadas pelas personagens que o povoam. Não são, pois, como sucede frequentemente no moribundo modelo do thriller contemporâneo, meros bonecos que se passeiam pela narrativa para fazer avançar a história e para desvendar os mistérios “habilidosamente” fabricados pelo argumentista. As personagens deste filme são meticulosamente construídas e mesmo os elementos mais secundários surgem insuflados de humanidade. Jake Gyllenhaal (o cartoonista), Robert Downey Jr. (o jornalista) e Mark Ruffalo (o polícia) formam um notável vértice humano que espelha todas as fragilidades e dúvidas de uma caminhada por uma verdade.
4) As camadas temáticas: «Zodiac» narra a história, baseada em factos verídicos, da investigação de uma série de homicídios que assolaram a baía de São Francisco nos anos 70 do século passado. À superfície temos, pois, uma narrativa essencialmente policial: perante uma série de homicídios reivindicados por um serial-killer misterioso, desencadeia-se uma investigação em busca do criminoso. Sucede, no entanto, que as circunstâncias que rodearam estes crimes permitem analisar um conjunto de outras questões, que Fincher expõe, com enorme inteligência e subtileza, em toda a sua complexidade. A busca das três personagens principais (e, digamos, do foco da câmara de Fincher) deixa a determinada altura de ser uma busca policial para passar a ser uma busca pessoal, deixa de ser a busca de um assassino para passar a ser a busca de um reequilíbrio interior. Ao atentar sobretudo nas consequências do crime para os investigadores, ao penetrar nas teias obsessivas por eles criadas, «Zodiac» afirma-se como um filme sobre a amarga inquietude da dúvida, sobre o desassossego interior provocado por uma caminhada sem retorno. E se a natureza da verdade, a ambiguidade dos comportamentos e as relações com os media são também temas amplamente analisados, retém-se sobretudo essa perseguição feita pelas personagens centrais. Uma perseguição que é uma espiral onde o espaço perde identidade e o tempo parece entrar em colapso. Só sobra a obsessão.
5 comments:
Depois disto: "Fight Club» (de longe o seu pior filme") este blogue desceu muito na minha consideração, mas mesmo muito.
"em «Fight Club» (de longe o seu pior filme) estatela-se em absoluto numa patetice sem remissão."
Concordo em absoluto. Um dos filmes mais sobrevalorizados da década passada, assim como um dos falhanços mais monumentais de que há memória, tendo em conta as expectativas que, à partida, se poderiam criar, assim como o alarido que se fez à sua volta.
Nunca acreditei que encontrasse quem achasse o "Fightclub" sobrevalorizado! Não há cão nem gato que não nomeie esta trip pretensiosa de Fincher como uma das obras-primas do cinema contemporâneo. Ao invés, considero que o "Panic Room" é subvalorizado, quando é um sincero exercício de thriller no mesmo espaço físico.
Abraço,
Bracken
Minha nossa senhora! Onde vão desencantar estes críticos. João Ricardo Branco, dedique-se à pesca.
Concordo em absoluto com a opinião de que "Seven" é uma obra perfeita e como sendo a melhor do realizador. Já é kitsch ouvir dizer que "Fight Club" é de longe o melhor filme de Fincher. Boas notas sobre "Zodiac" também.
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