30.4.08

Sentir «Blade Runner»

«Blade Runner», a obra-prima que Ridley Scott realizou há 25 anos, encontra-se actualmente em reposição em Lisboa, no seu final cut. Vê-lo projectado num grande ecrã e senti-lo no escuro de uma sala de cinema é um privilégio cinéfilo impagável. E ir revisitar as suas imagens pela milésima vez é sempre um desafio sedutor.

Gosto precisamente de pensar em «Blade Runner» como um imenso território, cheio de ambiguidades e contrastes, que está sempre receptivo a uma visita nossa. Antes da história e das personagens, há uma Los Angeles futurista a ser explorada e isso é o que sempre mais me fascinou e exaltou. É uma Los Angeles desconcertante: há o negrume, há uma chuva ácida que não pára de cair, há o caos urbano e populacional; mas há, também, algo de profundamente aconchegante, intimista e sensual. É um desconcerto arrepiante. Como aquele arrepio que sentimos quando ficamos aconchegados na cama a ouvir a chuva furiosa que cai lá fora! Não há muitos filmes assim, que despertem de forma tão impressiva esta sensação de fusão de mundos.

O desafio mais atraente de «Blade Runner» é este desafio de adaptação, de conhecimento, de percepção. É uma viagem que exige sensibilidade apurada e sentidos bem despertos: para captar as imagens e os sons, para tentar respirar aquele ar congestionado, para experimentar sentir aquela chuva a molhar os nossos rostos, para arriscar cheirar os odores entrelaçados no ar, para explorar aquelas ruas apinhadas de gente das mais diversas proveniências ou os becos mais sombrios e abandonados…

É este, confesso, o desafio que mais me mobiliza. Mas há outros. Muitos outros. Vale a pena, a esse propósito, recordar o que aqui escreveu o Tiago Pimentel em 2006 sobre o original cut.

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