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21.5.07

"Eu nunca fiz senão sonhar."

Em Big Fish, Tim Burton alterna realidade e ficção, contando a história de um pai às portas da morte que sempre contou as mais loucas aventuras da sua vida e de um filho que procura conhecer o homem que se esconde por detrás das histórias, ao mesmo tempo que este recorda algumas das fantasias que o pai sempre contou e que ainda conta.

No final, mesmo antes da morte do pai e do verdadeiro funeral, é a vez do filho lhe contar a história da sua morte (mas que o pai comenta, sorrindo com as forças que lhe restam, como sendo a história da sua vida). Apesar de todas as diferenças, em ambos os funerais há algo em comum, pouco característico: há mais sorrisos do que lágrimas.

Qual é afinal, o papel do sonho, o objectivo máximo das histórias loucas de Edward Bloom? Talvez seja esse: sorrir de tal forma nos sonhos que, quando volta à realidade, o sorriso vem com ele (ainda que a fantasia lá permaneça), e com os que o rodeiam também. E não há momento mais tocante e que melhor demonstre esse cruzamento do sonho com a vida do que aquelas imagens finais do funeral verdadeiro, em que vemos todos falando entusiasticamente, com sorrisos na cara em vez de lágrimas. De repente, percebemos que estão a contar histórias... as histórias de Edward Bloom.


Afinal, talvez não tenha sido tanto o fundo verdadeiro das suas aventuras que o definiram enquanto ser humano, mas o lado fantástico que lhes acrescentou. Talvez, com todas as viagens que fez (e que foram muitas), as mais verdadeiras tenham sido aquelas que fez dentro de si. E talvez tenha sido aí o lugar mais longínquo até onde viajou, onde se reencontrou, e onde foi finalmente reencontrado.

P.S.: Vem este post a propósito de um revisionamento que é ao mesmo tempo um visionamento, na medida em que foi, desta vez, visto na sua recente edição em blu-ray, com uma magnífica qualidade de imagem (se esquecermos o pormenor do ligeiro desequilibrio da quantidade de grão de cena para cena), que permite apreciar o fabuloso imaginário Burtoniano em todo o seu esplendor.

13.4.07

todos os sonhos do mundo


Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

- Álvaro de Campos

Sam Lowry não aceita uma promoção no emprego que a mãe, através dos seus contactos, lhe conseguiu arranjar. A mãe pergunta-lhe, indignada, se ele não tem desejos, esperanças, sonhos... Sam responde que não,
not even dreams. Mas, na verdade, ninguém tem sonhos como ele. Sonhos tão loucos que só se sonham de noite, mas que Sam também os sonha de dia - esses sonhos que também nos podem ser, ao mesmo tempo, mais reais que a vida. Porém, estão envoltos, simultaneamente, numa ideia trágica: são sonhados sem um único fundo de esperanças, no limite do desespero.

6.3.07

Great Expectations

Porque os sonhos não são do tamanho do corpo, mas da alma, o pequeno Pip (órfão, habitante de uma pequena aldeia em Inglaterra) tinha uma grande esperança: tornar-se um gentleman. Porém, não era por questões sociais que o queria fazer, mas porque na casa de uma senhora estranha (Miss Havisham), que por um desgosto de amor há anos não saía para ver a luz do dia, conheceu Estella, por quem se apaixonou, que se viria a tornar uma mulher fria e sem coração, como ela própria se descreve.

As grandes esperanças de Pip acabam por se realizar, pois alguém anónimo decidiu financiar os seus estudos em Londres. A partir daqui, Great Expectations é uma reflexão sobre o amor, sob todas as suas formas e toda a complexidade que esteja associada à palavra. Por um lado, a instável relação com Estella (porque não é o estatudo social que nos traz os sonhos que queremos); por outro, as saudades daqueles que deixou, que mesmo não sendo a sua família era como se fossem, mas que agora estão tanto mais distanciados quanto mais estão juntos, pois é quando as diferenças dos caminhos que tomaram se tornam mais evidentes.

David Lean é talvez o maior dos cineastas ingleses, e este filme é mais uma prova disso. Great Expectations pode ser tão doloroso e desencantado como naquela cena em que Pip volta à sua aldeia e imagina as vozes dos "familiares" e o que lhe diriam se tivesse passado a noite na sua antiga casa, e não no hotel; e ao mesmo tempo tão belo como naquele sublime momento em que Pip abre finalmente as cortinas da velha casa de Miss Havisham. Há muitos anos, tinha sido por amor que Miss Havisham as fechara; agora, é também por amor que a luz do sol pode voltar a entrar pelas janelas para iluminar Pip e Estella.

25.2.07

I (don't) Know Where I'm Going

SPOILERS

I Know Where I'm Going inicia-se com pequenos segmentos (de segundos) sobre o crescimento de Joan. Logo com um ano, constata o narrador em tom irónico, já sabia para onde ia: "não para a esquerda, nem para a direita, mas sempre em frente."

Com 25 anos, Joan continua igual: sabe o que quer e para onde vai, ateimando não se desviar do caminho que decidiu seguir. Assim, apesar do desapontamento do pai, casará em breve com um homem muito mais velho, rico, que tem uma casa numa pequena ilha chamada Kiloran, para onde Joan se dirige e onde, no dia seguinte, deverão casar.

Mas o mau tempo estraga os planos dos noivos, visto que a travessia para a ilha não pode ser feita nas presentes condições atmosféricas. É então que Joan conhece um homem de Kiloran (Torquil), que também está à espera de poder fazer a travessia.

E é aí que tudo se baralha e se confunde: as expectativas, as opções, os sonhos, os desejos. Enfim. Joan já não sabe para onde vai, ou para onde quer ir. Ou melhor: sabe o que quer porque o decidiu fazer por achar melhor para si; e sabe que isso é diferente daquilo que intimamente deseja.

Mas Joan, que desde que tem um ano segue sempre em frente sem se desviar do caminho, continua com a mesma determinação. Para evitar qualquer desvio que esse sonho possa provocar, Joan decide tentar fazer a travesia pagando a um rapaz para a levar de barco, na qual Torquil decide ir também, por não a ter convencido a não entrar no barco. Mas não só não conseguem chegar, como por pouco não morrem afogados.

Voltam a salvo, e no dia seguinte o tempo está bom. Joan pode finalmente partir e libertar-se daquilo que cada vez mais a perturbava ali; algo que a estava a impedir de ter a certeza de saber para onde vai. É então que na sublime cena de despedida Joan pede para Torquil a beijar. Durante breves segundos, o sonho e a vida misturam-se num só, e logo de seguida afastam-se, seguindo direcções diferentes, sem dizer mais uma palavra, deixando aquele momento como memória última do que passaram juntos. Agora, o sonho voltou a ser apenas sonho e a vida apenas vida. A vida está à sua frente, mas o sonho ficou para trás. Talvez não seja esse o sonho que quis, mas foi esse o que teve.

Porém, numa das cenas mais belas de sempre, Joan volta para Torquil, que se encontra num castelo que tem gravada uma maldição contra a sua família. Que verdadeiro milagre de sequência, essa em que tudo se inverte; em que definitivamente a vida e o sonho são a mesma coisa; em que a maldição se torna quase um milagre, através dos planos que lhe antecedem e sucedem, como naquele sublime plano final em que "acorrentados" se afastam juntos. Mas agora já nada é efémero. Agora, é acorrentados que deverão viver até ao fim dos seus dias, e morrer acorrentados.

9.1.07

There Is No Gene For The Human Spirit...

Porque as limitações do corpo não são as limitações da alma. Esta, em quaisquer circunstâncias, entrega-se à imaginação, e deixa-se a sonhar. O quê? O possível e o impossível.

Ou, como diz o personagem de Jude Law, "I got the better end of the deal. I only lent you my body; you lent me your dream." De facto, quanto vale um corpo quando comparado aos sonhos da alma humana?