4.1.07

Desilusão

Apocalypto de Mel Gibson

Primeiras impressões
Seja qual for a ideia que temos de Mel Gibson e do seu cinema, há que reconhecer que estamos perante uma voz singular. Gibson é de facto um autor na verdadeira acepção da palavra, com uma visão muito própria do mundo e isso reflecte-se inevitavelmente nos objectos que produz. Mas, entendamo-nos, um autor, qualquer autor, é um ser humano estando, portanto, sujeito a falhar. Olho para este Apocalypto de Mel Gibson como um objecto falhado.
Os omnipresentes temas da libertação, da decadência civilizacional inevitável, da existência de uma qualquer ordem divina natural, da predestinação do "herói", da redenção e da violência como forma de a atingir continuam a surgir como as forças motrizes deste cinema. Ressalta contudo a ideia de que Gibson parece, neste caso particular, ter-se deixado maravilhar em demasia pelo enquadramento, esquecendo a substância. Dito de outra maneira, Apocalypto tem visuais impressionantes, tem - à partida - personagens, tem diversas sugestões temáticas interessantes, mas nunca consubstancia verdadeiramente os seus motivos e intenções. Exemplo disso é a utilização da violência, que deixa aqui de ter um valor funcional para se transformar ela própria num personagem que contamina o filme, mas sem que tal tenha verdadeira dimensão consequente.
A linha narrativa de Apocalypto segue um personagem que corre pela selva fugindo aos seus captores na esperança de resgatar a família que deixou para trás. Tal como ele, Apocalypto corre freneticamente mas sem uma linha de rumo, ziguezageando e tocando aqui e ali nas folhagens dos "novos planos de consciência" que o realizador disse pretender atingir mas de forma tão fugaz quanto superficial.
No final a circunferência fecha-se, mas a sensação dominante é o vazio. A volta completou-se mas nada se ganhou verdadeiramente. Por isso, Apocalypto é, no limite, um filme inconsequente.

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