21.9.06

Quando um clássico é um clássico


Muitas vezes somos confrontados com clássicos absolutos do cinema, aclamados e recordados durante gerações, que nos deixam profundamente cientes da sua importância e notoriedade na data de estreia mas cujas histórias vão perdendo alguma da sua relevância. Ou pelo menos é um argumento extremamente recorrente utilizado por quem os vê. Um bom filme e uma boa história são sempre inestimáveis independentemente da respectiva idade. The Philadelphia Story é um desses clássicos que ninguém ousará de chamar datado e que terá sempre um lugar de destaque no cinema norte-americano inserido na idade de ouro de Hollywood. As políticas sexuais podem ter mudado (ou será que alteraram-se apenas à superfície) mas o prazer de ver a forma como as personagens deste “pentágono” amoroso interagem é tão inegável quanto a magistralidade da encenação e especialmente do argumento do filme: imparável, inteligente, hilariante e terrivelmente mordaz. E a realização de Cuckor acompanha este ritmo frenético de forma sumptuosa mas contida, deixando as atenções centrarem-se nos actores, os protagonistas naturais desta história adaptada de uma famosa peça de teatro, que revolve em torno de um segundo casamento de uma conhecida e privada socialite, cujo ex-marido tentará arruinar garantindo a presença de repórteres de uma popular revista “cor-de-rosa”. Cary Grant e James Stewart, dois dos mais populares actores de sempre e símbolos de uma época áurea, cruzam-se aqui como antíteses, um alheio aos eventos que acabam por inebriá-lo de uma forma quase juvenil (e que valeu o Óscar de Melhor Actor a Jimmy Stewart) e outro que parece controlar tudo o que decorre, que acabam por reunir-se para formar um retrato de diferentes aspectos da condição masculina, controlados pela presença feminina de Katharine Hepburn, a luz e alma de The Philadelphia Story, uma deusa intocável, com um poder e magnetismo extasiantes que controla em absoluto. A graciosidade desta “imortal” Tracy Lord é algo que só Katharine Hepburn poderia ter atingido, porque a contrastar com esta postura e presença de divindade inalcançável existe o mais minucioso e perfeito timing cómico. E principalmente uma faceta frágil, vulnerável e inesperadamente comovente que fazem desta interpretação uma das mais fulgurantes e marcantes de toda a sua carreira, um papel que poderia ter ido parar a outra actriz, numa altura em que Hepburn era considerada “box-office poison”, não fosse a imposição de Howard Hughes aquando da compra dos direitos cinematográficos para que fosse ela mesma a interpretar esta personagem que já era sua na Broadway. Agora é impossível imaginar The Philadelphia Story sem Hepburn, quase como se não fizesse sentido existir de todo. Assim, na sua plenitude, é uma obra-prima da comédia do cinema clássico que persistirá eternamente.




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