22.9.06

A Sobrevivência das Emoções


O que são as emoções humanas? Quais os seus limites representativos, até onde deve o cinema explorá-las sem as dilacerar? A inesperada resposta surge no belíssimo World Trade Center, um regresso à plena forma de Oliver Stone, numa realização soberba que acumula anos de experiência numa sucessão de inspiradíssimos momentos de Cinema.

Este ano, dificilmente seremos confrontados no grande ecrã com algo mais tocante que os rostos de Nicolas Cage e Michael Peña, deixando as suas emoções mais primárias guiá-los no caminho para a sobrevivência - e o feito desta obra maior está precisamente na serenidade e, sobretudo, na verdade com que o habitualmente turbulento realizador nos consegue fazer acreditar na sinceridade das palavras, na simplicidade dos pensamentos, na profundidade dos olhares. Por debaixo do pó e do metal fundido, sob um céu negro de morte, há dois corpos que heroicamente comunicam sem se ver, criando um elo de vida que levará a que sejam dos primeiros a (re)nascer num novo mundo, atenuando o Mal que se erguera naquele fatídico dia de Setembro. Mas World Trade Center não se fica por aí: em paralelo ao drama subterrâneo, a câmara de Stone penetra sobriamente, e como nunca até agora, as artérias familiares, captando instantes presentes e passados que põem em causa a sobrevivência daqueles homens não apenas enquanto indivíduos, mas enquanto entidades de uma família - também aqui a subtileza é extrema, sendo o sofrimento filmado a conta-gotas, sentindo-se quase sem que o pressintamos, em silêncios, respirações, pequenas explosões emocionais, afinal como... na vida real. Em última instância, é a família a verdadeira salvadora, a real religião daqueles dois seres, a razão para que renasçam e sobrevivam num mundo destroçado pela Dor.

Que Stone consiga tudo isto ancorando-se num acontecimento tão falado e até banalizado pela linguagem televisiva confere à obra um carácter fascinante, sendo notável como em nenhum momento ele é utilizado como objecto de manipulação fácil, mas antes como um cenário extraordinariamente imprevisto, reinventado sem artifícios, que confere a esta história uma força emocional única. Sem dúvida, um dos mais genuinamente comoventes objectos de Cinema dos últimos tempos.

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